segunda-feira, 7 de abril de 2014

Vagas-fantasma

'Vagas criadas não são vagas', diz ex-secretário de Alckmin sobre presídios de SP

Para Nagashi Furukawa, ex-secretário de Administração Penitenciária, 9.497 vagas computadas pelo governo tucano não podem ser consideradas locais para cumprir pena


O ex-secretário de Administração Penitenciária de São Paulo Nagashi Furukawa criticou a postura do governo Geraldo Alckmin (PSDB) de maquiar o número de vagas nos presídios de São Paulo para aumentar as estatísticas artificialmente. “Não vou tecer considerações sobre os motivos que levaram a isso, porque não sei dizer, mas que essas vagas não são vagas, evidentemente que não são”, afirma. 
Segundo reportagem da Folha de S. Paulo do dia 4 de abril, a gestão estadual considera ter ampliado a capacidade de sistema em 14.733 vagas, das quais 5.236 são produto de reformas e 9.497 proveem de áreas como enfermaria, celas disciplinares (onde há o chamado castigo), triagem e outras que não podem ser contabilizadas como “novas vagas”.

“Se no presídio tem lugar para pessoas doentes, por exemplo, quem está numa cela normal e fica doente, vai para aquele local [enfermaria] para ser atendido. Terminado o atendimento, volta para a cela. Não é lugar para cumprimento de pena”, diz Furukawa, que foi secretário de 1999 a 2006, período que abrangeu os governos de Mário Covas, Geraldo Alckmin e Cláudio Lembo. Furukawa pediu demissão em maio de 2006, após o período de pânico provocado pelos ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC) no estado.

Segundo Daniel Grandolfo, presidente do Sindicato dos Agentes de Segurança Penitenciária do Estado de São Paulo (Sindasp), a medida do governo é uma tentativa de desviar a atenção dos índices de superlotação do sistema. “A imprensa estava massacrando o governo pela incompetência, pela falta de planejamento do governador, porque a superlotação no estado chega ao dobro da capacidade. Estava chegando perto de 100% o índice de presos a mais do que a capacidade”, explica.

Sem contabilizar as vagas criadas com o aumento artificial, o sistema penitenciário paulista conta cerca de 109 mil vagas, mas comporta 210 mil presos, ou 93% a mais do que deveria. Com o acréscimo de 14.733 que entraram na soma, o número chega a quase 124 mil vagas para os mesmos 210 mil presidiários, o que rebaixa o índice de superlotação para 70%.

“Para minimizar esse impacto dos 100%, o governo criou 14 mil vagas. Criou da noite para o dia quase 20 presídios”, calcula o sindicalista. Ele se baseia no fato de que cada presídio deveria comportar 768 presos.

Grandolfo esclarece que, das 14.733 novas vagas, 5.236 “realmente” são produto de reformas. “Eles reformaram os presídios e aumentaram as camas. Por exemplo, em lugares onde tinha beliches, transformaram em 'treliches'. Aumentaram em cerca de 5 mil vagas dessa forma.”  Mas as 9.497 restantes são as vagas-fantasma. “Eles acharam que aumentando mais 9 mil na surdina ia passar”, diz o presidente do Sindasp.

O promotor criminal de Taubaté, Paulo José de Palma, afirma que, com base em informações divulgadas pela imprensa, vai oficiar o procurador-geral de Justiça, Marcio Elias Rosa, na semana que vem. “A apuração em si deve ser determinada por ele, porque é uma questão de abrangência estadual.”

 

Superlotação


Para Nagashi Furukawa, só há duas possibilidades de solução para a questão da superlotação do sistema penitenciário. “Nesse campo, não existe milagre. Os dois únicos jeitos de manter a lotação normal são, ou construindo mais presídios, ou soltando mais os presos. Isso sempre teve e sempre vai ter. É um assunto do Judiciário. Há uma realidade concreta: os presos só estão presos porque os juízes entendem que devem estar presos. Não adianta a gente ficar questionando se o juiz está certo ou errado”, acredita o ex-secretário. “Enquanto não se aumentar o número de prisões ou não se soltar mais gente, vai haver superlotação.”

A análise parece coincidir em parte com a visão da própria Secretaria de Administração Penitenciária e do governo de São Paulo, para os quais quanto mais presos, mais séria é a política prisional. “No estado de São Paulo, o aumento da população prisional é fruto da política séria adotada pelo governador Geraldo Alckmin, em coibir e combater a ação criminosa. São Paulo conta, hoje, com a polícia que mais prende no Brasil”, respondeu a SAP a uma reportagem da RBA feita em fevereiro.

Na ocasião, a secretaria informou que a política do governo “se reflete no continuo aumento no número de "inclusões". "Em 2011, tivemos uma média mensal de entradas de pessoas presas nas unidades da SAP de 8.447 por mês. No ano seguinte, esse número passou para 8.949 presos/mês. Fechamos o ano de 2013 com uma média mensal de inclusão de 9.411 pessoas”.

A SAP não havia retornado à RBA até o fechamento desta reportagem.


 fonte: RBA
créditos: Eduardo Maretti

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário